“Seus governantes distribuem sem equidade o que pertence ao Estado – todas ou a maior parte das coisas boas para si mesmos, e os cargos públicos sempre para as mesmas pessoas, olhando acima de tudo a riqueza; e destarte os governantes são poucos e maus, em lugar de serem os mais dignos” (Ética a Nicômacos, VIII, 10). Aristóteles
A democracia, nascida por volta do século VI a.C., na Grécia Clássica, em Atenas, foi ao longo do tempo passando por profundas transformações, que trouxeram impactos em aspectos sociais, políticos e econômicos. A cada mudança, novas expectativas eram criadas pelo povo, na esperança de que houvesse melhoria da qualidade de vida da população em geral, assim como ocorresse maior participação dos cidadãos na condução dos destinos da sociedade.
A democracia, vista como governo do povo, na época ateniense, não se assemelha àquela que hoje é vista como a ideal, no mundo moderno, pois outrora se restringia ao direito político. Dela participavam poucos. Apenas homens nascidos de pais e mães atenienses, adultos, livres e cumpridores de suas obrigações militares eram “cidadãos”. As mulheres eram inferiorizadas, as crianças eram demasiadamente jovens para a cidadania, os anciãos eram dispensados das funções cívicas, sendo “apenas e tão somente” cidadãos aposentados. Estrangeiros e escravos sequer eram incluídos no conceito de cidadão.
Hoje o direito à participação política, que pretende ser de todos, visa, sobretudo, uma vida digna, com direito à saúde, segurança, educação, liberdade e mobilidade, mais além do mero exercício da escolha de representantes políticos. De fato, viver bem e dignamente, em uma sociedade igualitária e em liberdade, é o que almejamos num regime democrático de pleno direito, resumindo-se isso num estado de bem-estar comum a todos.
Já em sua origem ateniense, a democracia surgiu da insatisfação popular para com monarcas absolutistas e muitas vezes tirânicos, e logo foi apoderada por grandes proprietários de terras (aristocratas) que, junto com os novos ricos do comércio, rapidamente se transformaram em oligarcas, e pouco depois converteram-se em tiranos. De se lembrar que aristocracia é entendida como a organização social e política em que o governo é monopolizado por uma classe privilegiada. Aristóteles a entendia como o governo de poucos, dos “melhores” cidadãos possuidores de elevada formação moral e intelectual, que estariam aptos a atender aos interesses do povo.
A aristocracia, da qual participavam os que possuíam a noblesse, o domínio da cultura, da política e da economia, rapidamente se converteu em oligarquia, modo de governo em que os governantes passaram a atender primordialmente a interesses privados e próprios, em detrimento da plebe rude. Da monarquia passou-se à aristocracia, e desta a um poder oligárquico, mesclado muitas vezes com a tirania. Os modelos, em comum, tinham o fato de estarem sempre dissociados das necessidades do povo, adotando, porém, requintes e ares cada vez mais sofisticados em sua forma de atuar, para dar a impressão de preocupação social. A perversidade contra o povo continuou, mas gradualmente mudou a maneira de operacionalizá-la.
O fato é que, desde seu nascedouro até os dias de hoje, a democracia, vista como fundamental ao nosso direito à “cidadania”, se bem tenha evoluído em especial sob o ponto de vista conceitual e filosófico, longe está de alcançar uma enormidade de pessoas cujos direitos são relegados à própria sorte, e que na prática é ignorada por aqueles escolhidos para representar-lhe na missão de buscar o atendimento das necessidades fundamentais do povo.
Os representantes eleitos – que com pompas e traquinagens em campanhas se comprometeram a atender as aspirações de seus eleitores – viram-lhes as costas. Mas, lamentavelmente, os que têm o poder democrático de eleger, quais sejam, os eleitores, não atuam efetivamente para contraporem-se a essa situação. Pesquisa do Ibope, de 2003, indicava, naquele então, que 56% dos brasileiros não desejavam participar de atividades destinadas a influenciar políticas públicas, 35% sequer conheciam tais atividades, e 26% viam o assunto como demasiado “chato”.
Oxalá, desde aqueles idos anos de 2003, tenhamos modificado nosso ânimo de labutar nas lides políticas. Mas…
Em 2014, o TSE – Tribunal Superior Eleitoral divulgou pesquisas sobre o novo perfil dos eleitores brasileiros que, se bem mostrou alguns avanços, a meu ver não indicaram grandes mudanças em nossa combatividade, enquanto cidadãos. Imaginem o que estará passando na cabeça e na motivação do eleitorado neste momento tão catastrófico e vergonhoso que o Brasil vive, em que a falta de escrúpulos, de ética e de dignidade parece prevalecer no mundo político e empresarial.
Mas, e nós, colegas aposentados e da ativa e os pensionistas vinculados ao Banco do Brasil? Como estamos, para onde vamos, o que queremos?
As recentes eleições para as mais importantes entidades voltadas para nossa sobrevivência e qualidade de vida, quais sejam, PREVI e CASSI, têm indicado que também entre nós existe forte apatia, descrença e desencantamento, especialmente entre os aposentados e pensionistas, mas não exclusivamente. Isto é menos notado entre o pessoal que permanece na ativa, por serem praticamente obrigados a se manifestarem, vez que as práticas e regulamentos vigentes em nosso sistema eleitoral emitem permanentes alertas em equipamentos de informática, que não deixam os funcionários da ativa em paz, enquanto eles não manifestarem seus votos, não raras vezes sob atentos olhares de superiores hierárquicos.
O SISBB é uma forte arma, para o bem ou para o mal, conforme o poder de turno dele queira fazer uso. Portanto, não podemos esquecer que, também nós, estamos sujeitos à intervenção forte do poder do patrão da vez, pois é ele quem determina os meios e os canais a serem disponibilizados para que nossos direitos de votar e escolher sejam exercidos. E somos igualmente reféns do poder econômico, haja vista que há correntes claramente mais abastecidas de dinheiro que outras, o que também é fator gerador de assimetria nos pleitos, modificando as relações de poder e, por conseguinte, influenciando fortemente as escolhas delas decorrentes.
Porém, sob a minha ótica, o mais perigoso, tenebroso e cruel mal que nos assola é a apatia, o absentismo eleitoral, pois ao deixarmos de participar, de votar, de eleger, deixamos para outros as prerrogativas das escolhas de nossas representações, e logo dos nossos destinos.
Nossos desencantos têm causas, como mostram as insatisfações capturadas especialmente em mídias eletrônicas, mas também em conversações presenciais. Parece claro que é forte a influência de aspectos econômicos e afins, pois há benefícios que muitos gostariam de ver concedidos, tais como um novo BET – Benefício Especial Temporário, redução de taxas de juros em empréstimos, prorrogações ou alongamentos de prazos para endividamentos, aumentos de benefícios acima dos níveis inflacionários, ampliação e melhoria da rede de credenciamentos de médicos e terapeutas diversos, descontos crescentes na aquisição de medicamentos, atendimento mais célere às demandas por internações, consultas, exames etc.
O conjunto de pleitos é amplo e diversificado. E muito deles de difícil concessão ou viabilização nos tempos atuais, seja por impossibilidades financeiras, conjunturais, legais e regulamentares ou um conjunto delas. Mas, nisso tudo, parece haver muita desinformação a respeito das limitações existentes, o que também contribui para enervar e até mesmo radicalizar algumas posturas. Há espaço claro para a melhoria da comunicação entre as partes e para a ampliação da transparência. Há que se dizer que se percebem esforços nesse sentido, mas ainda não alcançam a totalidade e variedade de públicos que compõem nossa comunidade vinculada ao BB.
O certo é que as redes sociais, especialmente, não perdoam, e o controle social vem sendo permanente exercido e provoca, ainda que gradualmente, melhoras em nossas relações. Mas, a democracia participativa e informativa tem espaço para aperfeiçoamentos, desde que as partes tenham a possibilidade de interagir sem interesses outros que não o bem-estar comum, o que leva de pronto à defesa intransigente de nossas entidades mais caras, quais sejam, PREVI e CASSI. Para isto, ganha destaque cada vez maior o papel das associações, no que pesem estas estarem enfrentando severas dificuldades inclusive para receber suas mensalidades. Porém, o que não podemos fazer é desistir! Democracia se faz com participação, senso crítico e respeito mútuo. Sigamos na luta.
Williams Francisco da Silva